Os desastres causam
um alto custo social e econômico às sociedades. Reduzindo a exposição e
adotando novas estratégias para aumentar a resiliência, esses custos podem ser
reduzidos.
A
responsabilidade pelo manejo dos riscos para os desastres não está somente nas
mãos de gestores de desastres. É, na verdade, uma preocupação de todos – de
cidadãos que deveriam estar mais empoderados para tomar decisões de como
reduzir os riscos, a líderes políticos, instituições governamentais, setor
privado, sociedade civil organizada, entidades de classe e instituições
tecnocientíficas.
O background cultural (crenças, atitudes,
formas de ver o mundo) de uma pessoa exerce um papel essencial na sua
habilidade e nas formas de enfrentamento que ela colocará em prática ao
vivenciar situações traumáticas (trauma entendido aqui como resultado de uma
constelação de experiências de vida vividas numa condição estressante persistente
ou como um evento agudo). Por sua vez, cada cultura e cada sociedade colocam à
disposição das pessoas dispositivos de compreensão, avaliação e possibilidades
de lidar com situações altamente estressantes, diminuindo as probabilidades de
elas provocarem traumas. Haverá então um entrecruzamento desses dispositivos
sócio-culturais com as predisposições individuais para permitir que a pessoa supere
esses momentos estressantes. Essa capacidade de lidar de forma adequada com
situações que transbordariam a capacidade da pessoa de suportar uma situação
ameaçadora e ainda sair fortalecido dela chama-se resiliência, que pode ser
construída a partir desses dispositivos sócio-culturais.
Conjugada com as questões sócio-culturais, uma
série de fatores psicológicos contribui para a boa adaptação de uma pessoa à
adversidade. Eles incluem as percepções individuais e o comprometimento
pessoal, a busca individual pelos recursos sociais e as estratégias individuais
específicas de enfrentamento.
Os modelos de crenças determinantes para uma
pessoa podem ser estruturados desde a infância, com base nas experiências
vividas. A organização do processamento das informações no momento da situação
de risco influencia de forma decisiva os estilos comportamentais, assim como a
maneira como as pessoas creem acaba definindo como irão se comportar em certas
situações, por exemplo, como será seu comportamento quando enfrentarem desafios
no trabalho, na família, na escola ou nas diversas posições que assumem na
vida.
Portanto, resiliência é um produto interativo
dessas crenças, atitudes, abordagens, comportamentos vivenciados pelas pessoas
em determinadas culturas, que podem ajudá-las a se sair melhor em situações de
adversidade e se recuperarem mais rapidamente. Pessoas resilientes são mais
flexíveis durante as condições de estresse e costumam retornar mais rapidamente
aos níveis de funcionamento psicológico e social anteriores ao infortúnio. No
entanto, ser resiliente não significa que as asperezas da vida não serão
complicadas e preocupantes; significa que esses eventos são superáveis, com maior
ou menor facilidade.
O conceito de resiliência apresenta duas
dimensões: uma força inerente ao sujeito (indivíduo, família, comunidade) para
melhor resistir ao estresse e ao choque e a capacidade desse sujeito se recuperar
rapidamente desse impacto. O aumento da resiliência pode, dessa maneira, ser
alcançado tanto pelo incremento dessa força interna (e ao mesmo tempo reduzindo
sua vulnerabilidade) quanto na redução do impacto da situação estressante, ou,
ainda através de ambos. Isso requer uma estratégia multifacetada e uma
perspectiva ampla dos sistemas direcionados a reduzir os múltiplos riscos de
uma crise, ao mesmo tempo aumentando os mecanismos de enfrentamento e de
adaptação nos níveis local, regional e nacional, envolvendo pessoas e
comunidades.
A resiliência pode ser aprendida e
desenvolvida por cada um de nós. As pessoas podem começar a construir a
resiliência a qualquer tempo, incluindo antes, durante e após uma situação
altamente estressante. Por que as pessoas diferem em como elas comunicam os
sentimentos e enfrentam a adversidade, há uma série de maneiras de construir
resiliência. Por exemplo, algumas pessoas encontram grande suporte e consolo em
suas famílias e comunidades, enquanto outras procuram isso fora, em colegas e
amigos próximos.
Uma compreensão mais profunda de resiliência e
fatores de risco oferece a chance de se desenvolver estratégias de ajuda e
padrões de enfrentamento (coping) específicos para cada cultura. A partir dessa
compreensão, as prestações de serviços clínicos e psicossociais necessitariam
ser adaptadas para que no futuro uma ajuda mais eficiente seja oferecida em
consonância com o background cultural da pessoa ou da comunidade. Por exemplo,
mesmo que um evento inicial não envolva saúde pública, disrupções sociais podem
levar rapidamente a múltiplos riscos, incluindo epidemias. Sistemas públicos de
saúde devem ser fortalecidos e sustentados, ambos para evitar o desastre e
responder à sua ocorrência. Capacitação para responder aos impactos de saúde
causados pelos desastres, especialmente em populações vulneráveis, deveria ser
uma parte integral dos serviços de saúde pública fortalecidos.
Resiliência contra desastres é baseada na
decisão dos indivíduos de compartilhar suas responsabilidades para a prevenção,
resposta e recuperação dos desastres. Eles podem fazer isso utilizando um guia,
recursos e políticas governamentais e outros recursos, como organizações da
própria comunidade. A resiliência contra
desastres das pessoas e das famílias é significantemente aumentada por um plano
ativo de preparação para proteger a vida e a propriedade, baseada numa
preocupação pelas ameaças relevantes para sua localidade. É também aumentada
quando se conhece e se está envolvido nos manejos da comunidade local para
prevenir desastres, principalmente envolvido como voluntário.
Os elementos de construção de resiliência
podem incluir: avaliação e monitoramento dos riscos de desastre, assim como sua
compreensão; sistema de alerta efetivo; estabelecimento de uma cultura de
responsabilidade pelas comunidades, incluindo setor privado e organizações
civis, para planejamento e cooperação na preparação, resposta e recuperação; planejamento
em longo prazo; investimento e aplicação de medidas preventivas, tais como
regras para uso do solo e para construção, e pesquisa e avaliação sobre fatores
de risco.
As ações para o fortalecimento da resiliência
precisam ser baseadas em metodologias potentes para a avalição de risco e de
vulnerabilidade. Essas avaliações deveriam servir como base para a elaboração
de estratégias de resiliência, assim como para o desenho de projetos e
programas específicos.
Pensando que uma comunidade seria um grupo
social, religioso, ocupacional, ou outros, que dividem características ou
interesses comuns ou percebem a si mesmas como distintas em algum aspecto da
sociedade onde se situa, podemos dizer que cada uma delas se estrutura de
determinada maneira, mesmo estando sob os mesmos aspectos sócio-culturais.
Assim, a capacidade para resiliência de uma
comunidade deveria ser desenvolvida em suas múltiplas formas, respeitando suas
características e possibilitando que ela ofereça um amortecedor para a dor, um
contexto para a intimidade e que sirva como repositório para tradições que unem
as pessoas. Além dessas características, o bom funcionamento sob estresse,
adaptação bem sucedida, autoconfiança e capacidade social também influenciam na
resiliência da comunidade. Construir resiliência comunitária envolve um
processo de ligar em rede uma série de capacidades adaptativas e essa ligação
organizacional ajuda a construir resiliência coletiva.
Comunidade resiliente é aquela que possui um
administrador competente e responsável, permitindo que a população participe e
decida sobre o planejamento de sua cidade, levando em conta suas capacidades e
recursos, garantindo uma urbanização sustentável com a participação de todos os
grupos populares. Isso permite que muitos desastres sejam evitados em função de
uma infraestrutura adequada (saneamento básico, drenagem) e serviços básicos
(escolas, coletas de lixo, serviços de emergências).
Por outro lado, muitos fatores conhecidos tem
aumentado a vulnerabilidade das comunidades para os desastres. Os estilos de
vida e de trabalho, mudanças demográficas, migração doméstica e a fragmentação
da comunidade estão aumentando sua suscetibilidade, assim como alterando as
redes sociais locais e a sustentabilidade de grupos de voluntários. Pressões
para que o desenvolvimento urbano se estenda para áreas de alto risco para
desastres naturais compõem o problema, assim como a expectativa de que os
mesmos serviços e equipamentos estejam disponíveis onde quer que se escolha
morar. As comunidades devem ter a
oportunidade de decisão com relação a seus planos sobre redução de riscos
(dividindo responsabilidades para compreender esses riscos, controlando seus
impactos e se preparando para o enfrentamento e recuperação). Igualmente,
algumas vulnerabilidades podem ser contrapostas em parte por fortalezas e
outras capacidades comunitárias.
Uma infraestrutura social estabelecida inclui canais de informação, redes sociais e organizações comunitárias. Instalações e processo sociais podem ser planejados e desenvolvidos para prover grande suporte à comunidade. Através de treinamentos e de informes de riscos as comunidades podem ser tornadas mais resilientes aos desastres.
Uma infraestrutura social estabelecida inclui canais de informação, redes sociais e organizações comunitárias. Instalações e processo sociais podem ser planejados e desenvolvidos para prover grande suporte à comunidade. Através de treinamentos e de informes de riscos as comunidades podem ser tornadas mais resilientes aos desastres.
Virtualmente todo desastre é local, portanto,
há uma tendência a enxergar resiliência como uma questão local ou da
comunidade. Mas isso tem criado um problema maior para o desenvolvimento de
esforços de manejo do desastre baseado na resiliência no nível nacional. A
resiliência deveria ser vista como uma questão maior de importância nacional e
de política pública, assim como parte essencial dos processos de tomada de
decisão nos programas de manejo efetivo dos desastres.
Deve ser entendido que resiliência não deve
ser criada após o desastre para situar o problema. Muitas vezes, as pessoas
tendem a reconhecer problemas relevantes após o desastre, quando eles são
expostos pela mídia. O desastre demonstrou que os problemas essenciais – como a
demora em passar informações para as pessoas diretamente afetadas pelo desastre
– foram as maiores falhas do sistema atual. Esses problemas deveriam ser
situados com um programa de manejo de desastre baseado na resiliência, só que antes
do desastre ocorrer.
Algumas prioridades precisam ser identificadas e
colocadas em prática para se alcançar resiliência comunitária contra desastres:
a redução dos riscos para desastre deve ser uma prioridade local e nacional; é
preciso identificar, avaliar e monitorar os riscos a desastres e melhorar os
sistemas de alerta; é necessário usar de conhecimento, inovação e educação para
construir uma cultura de segurança e resiliência em todos os níveis; reduzir os
riscos subjacentes e fortalecer a preparação para os desastres para uma efetiva
resposta e recuperação em todos os níveis, do local para o nacional são tarefas
imprescindíveis.
Em face dos perigos e riscos é importante ter
panos e arranjos para prevenir, responder e se recuperar das emergências e
desastres. Esses planos, que deveriam ser preparados pelo menos no nível
municipal, devem ser desenvolvidos em conjunto com organizações de serviços de
emergências apropriadas. Esses planos devem ser abrangentes e estar
atualizados. Portanto: é preciso estabelecer mecanismos de organização e coordenação
de ações com base na participação de comunidades e sociedade civil organizada, incentivar
que os diversos segmentos sociais compreendam seu papel na construção de cidades
mais seguras com vistas à redução de riscos e preparação para situações de desastres,
elaboração de documento de orientação para a redução de riscos e a oferta de
incentivos aos moradores de áreas de risco: famílias de baixa renda,
comunidades, comércio e setor público, para que invistam na redução dos riscos
que vierem a enfrentar, investimento na criação de programas educativos e de
capacitação para a redução de riscos de desastres, tanto nas escolas como nas
comunidades locais.
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